A menina do cabelo de mola
Juliana era uma menina bacana prá chuchu. Era inteligente, divertida, amiga, carinhosa. Tinha uma porção de amigos em todos os lugares: na escola, no prédio, no clube. Seus amigos a chamavam de Jujuba, porque diziam que ela era doce demais para ser Juliana. Jujuba gostava muito de sua escola, mas agora que ela mudaria de série, também teria que mudar de escola. Mas ela não estava preocupada: sabia que logo teria um bocado de amigos novos.
Jujuba foi para uma escola nova em outro bairro, onde não conhecia ninguém. Logo no primeiro dia, conheceu as meninas da turma: Luiza, Fernanda, Gabriela e Maria Antônia. Todas elas eram parecidas: tinham os cabelos loiros e muito lisos – tirando a Gabriela, que tinha os cabelos castanhos, mas também bem lisinhos. Jujuba, por outro lado, era bem diferente delas. Tinha a pele mais escura e o cabelo era de mola: todo enroladinho! Mas isto não impediu que todas se tornassem amigas instantaneamente, claro.
Maria Antônia – Tônia, como a chamavam – era a mais velha da turma. Por isso mesmo, se sentia no direito de decidir a brincadeira. Logo no primeiro dia em que Jujuba entrou para a turma, Tônia disse:
• Hoje vamos brincar de princesas! Eu vou ser a Aurora, porque o meu cabelo é loiro igualzinho ao dela. A Luiza vai ser a Cinderela. A Fernanda vai ser a Rapunzel, já que ela tem o cabelo mais comprido de todas nós. E a Gabi vai ser a Branca de Neve, porque tem o cabelo escuro.
• E eu, Tônia, vou ser quem? - perguntou Jujuba.
• Ih, é, Jujuba, esqueci. Você... vai ser a fada madrinha, está bem?
• Está bem - Jujuba respondeu, feliz em brincar com suas novas amigas.
Conforme os dias foram passando, Jujuba começou a estranhar a brincadeira. Todos os dias brincavam de princesas. E todos os dias ela não era uma das princesas! Era madastra, irmã malvada ou fada madrinha.Todos os dias ela tinha que, de alguma forma, servir às outras. Até que, no final da semana, cansou da brincadeira. Quando Tônia começou a nomear as princesas, foi logo avisando:
• Tônia, hoje eu quero ser princesa também! Cansei de ser fada madrinha.
As meninas olharam umas para as outras com espanto. Tônia, um pouco sem graça, disse:
• Desculpa, Jujuba, mas não pode.
• Por que? - perguntou a doce menininha.
• Porque princesa não tem cabelo de mola como o seu!
Jujuba ficou muito, muito chateada mesmo. Acabou não querendo brincar de nada neste dia. Assim que chegou em casa, correu para a sua prateleira de livros e pegou um livro enorme, cor de rosa, com uma única palavra no título: 'Princesas'. Abriu- o e começou a folheá-lo. Tinha as histórias da Branca de Neve, da Rapunzel, da Bela Adormecida, da Ariel, da Cinderela. Nem lia as histórias, estava hipnotizada olhando as gravuras. Nenhuma, nenhuma princesa tinha cabelo de mola! Suas amigas estavam certas. Ela nunca poderia ser princesa. Fechou o livro e chorou. Chorou até dormir. Estava tão chateada que nem levantou para jantar.
De manhã bem cedinho, Jujuba escutou um barulhinho e despertou. Sua irmã mais velha estava na sala, vendo televisão. Foi até a sala e perguntou para a irmã o que ela estava vendo. Levou um susto com a resposta.
• Acorda, Juliana, hoje é o casamento da princesa!
• Que princesa? Da Cinderela? - a menina perguntou.
• Não! Da princesa de verdade, olha ali – e mostrou um príncipe e sua noiva, agora uma princesa, em um casamento de verdade, num país longe que Jujuba nem sabia que existia.
Jujuba assistiu, fascinada, às imagens do casamento. Era tudo tão bonito! A princesa era tão linda, com um vestido tão maravilhoso, e... com um cabelo tão liso. Ao perceber isso, Jujuba não conseguiu conter as lágrimas. Sua irmã não entendeu nada.
• Que houve, Jujuba, o que te deixou triste?
• Eu estou triste porque nunca vou ser princesa!
A irmã soltou uma gargalhada, abraçou sua irmãzinha e disse:
• Você não sabe disso, Jujuba. Quem sabe você não casa com um príncipe de verdade e vira princesa, igual a esta da televisão?
Entre soluços, a menina respondeu:
• Não, eu nunca vou ser princesa, nem de verdade e nem de mentira.
• E por que você acha isso? - indagou sua irmã.
• É porque eu tenho cabelo de mola, e princesa tem cabelo liso! - a menina respondeu isso chorando forte como a irmã nunca vira.
Tatiana, a irmã mais velha, secou as lágrimas dos olhos de sua irmã caçula, deu-lhe um beijo e abraçou-a com força até que ela se acalmasse. Assim que a menina parou de chorar, Tatiana disse:
• Juliana, eu quero que você olhe para a televisão.
• Eu tô olhando – respondeu a menina.
• Presta atenção. Repara nisso: a princesa não se mexe. Tem que ficar ali, parada, acenando com a mão. Está todo mundo olhando para ela, e nem dar um beijo na hora que quer ela pode. Ela não pode fazer nada. É quase uma estátua viva. É isso que você quer?
• Não, mas...
• Princesa é bonito em conto de fadas. Mais legal é ser gente de verdade. Assim, igual a mim e a você. Quando eu casar, eu vou dançar a noite toda, vou tomar aquela bebida de bolhinhas chique, vou fazer uma bagunça danada! Não vou querer ficar só acenando minha mão, não! E aposto que você também não quer isso!
Jujuba riu de imaginar a irmã acenando, quase como uma estátua, para todos os que passavam. Não, ela também não queria isso. Deu um beijo na irmã e saiu da sala saltitando de felicidade.
Quando chegou a hora do recreio, na escola, Tônia foi logo definindo os papéis, como sempre. E disse:
• Jujuba você vai ser a governanta do castelo, nós dançamos e você prepara o chá e...
Jujuba interrompeu sua amiga.
• Tônia, eu até posso brincar de princesa, mas só se for para brincar direito.
• Como assim? - as meninas estranharam.
• Vocês não são princesas?
• Sim!- responderam todas juntas.
• Então vocês tem que ficar sentadinhas aí, acenando para todo mundo!
• Mas, mas, não é assim que...
Jujuba interrompeu Tônia novamente.
• É assim que é a vida de princesa. Eu vi hoje uma princesa de verdade casando na televisão. Se vocês são princesas, tem que brincar assim!
Mesmo contrariadas, as meninas sentaram e ficaram acenando. Jujuba, com seu cabelo de mola, foi brincar de pique com os meninos, pulou corda, brincou de elástico, fez uma farra tremenda. No meio do recreio, suas amigas perguntaram se não podiam brincar também e ela respondeu que não, princesa só acenava e mantinha a pose. 'Brincadeira de verdade é para gente de verdade', Jujuba explicou.
Daquele dia em diante, nunca mais se brincou de princesa naquela escola. Todas as meninas diziam: 'meu cabelo é liso, mas faz mola quando eu tomo banho. Posso brincar como gente de verdade?' Jujuba ria e concordava. Era bom ter amigas de verdade ao invés de princesas!
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